Hoje a meio da tarde li um artigo relativamente ao aumento
do salário mínimo. Acabei por partilhar o link no meu Facebook e desabafar
(mais uma vez) a minha frustração e tristeza com o estado do meu País juntamente
com a minha confusão com a indiferença do povo Português. Já estou em
Inglaterra há mais de três anos e quando olho para trás, visualizo dois
cenários completamente diferentes. Numa tela vejo como a minha vida mudou, o
quanto aprendi, o quanto cresci, o que vivenciei em Inglaterra. E na tela que
representa Portugal não vejo nada. Tudo estático. Nada mudou. E isso custa-me.
Pela minha família, pelos amigos, por aqueles que parece que não têm voz ou a
quem a voz se esgotou porque os gritos de desespero por ajuda para aqueles que
nos deviam servir não tiveram qualquer efeito.
Eu compreendo. Toda a gente tem o seu limite. Uns resignam-se,
outros juntam-se a eles e outros, como eu, emigram.
Mas adiante. A minha Mãe comentou no meu post e mencionou a
minha situação de há uns anos quando estava grávida em que, muito basicamente,
fui despedida da TvCabo, onde na altura trabalhava a full-time.
Um pouco de background à situação. Comecei a trabalhar para
a TvCabo quando tinha 19 ou 20 anos. Foi o meu segundo trabalho a sério, o
primeiro foi no 1696 na TMN.
Comecei como muita gente, no call centre. Estava na linha de
retenção.
A linha de retenção é aquela linha dedicada que quando
alguém contacta um serviço a dizer que quer rescindir, fala com um menino ou
uma menina muito simpático/a e lhe é oferecida uma oferta ou um desconto para
que a pessoa mantenha o serviço. Eu era uma dessas meninas simpáticas e foi lá
que conheci o Pai da minha filha que também lá trabalhava.
Passado uns anos, abriu uma vaga para o
Departamento de Auditorias onde eram avaliadas as chamadas dos operadores de
diversas linhas de apoio ao cliente; eu consegui a vaga e transferiram-me para
esse Departamento.
Problema? Deixava de estar empregada com contracto
apesar de continuar empregada por uma agência diferente (Reditus) MAS teria que começar a
passar recibos verdes.
Ora bem, eu na altura tinha talvez uns 21 anos e recibos
verdes para mim não significava grande coisa. Existiam algumas notícias que
davam conta dos “falsos recibos verdes” mas a informação era escassa e para ser
sincera isso estava completamente fora do meu radar, por ingenuidade minha achava que falsos recibos verdes é para quem trabalha para empresas que não são de confiança.
Acima desse
Departamento, só os altos quadros. Isto significava progressão de carreira. "Bora lá", pensei eu.
Aos 23 anos, resolvi ir para a Universidade. Fui mais tarde
que o normal por motivos pessoais mas na altura a minha vida estava estável o
suficiente e tinha o apoio da minha família então candidatei-me e entrei.
Entrava na TvCabo cedinho de manhã, à hora de almoço ia para a Universidade e
depois voltava ao final da tarde e trabalhava até tarde. Perdi conta às vezes
que saí daquele edifício à meia-noite… Mas o meu trabalho não dependia de
ninguém e a minha chefe concordou que não havia problema em eu dividir o meu
horário assim desde que o trabalho aparecesse feito. (Obrigada Su, és especial.
Beijinho.)
Entretanto, houve mudança de chefias e eu engravidei. Estava
grávida de 3 meses sem saber. Dia sim, dia não ia ao hospital porque me sentia
super mal. Exames de gravidez? Negativo. Testes ao sangue? Tudo bem.
Ecografias? Tudo fantástico e maravilhoso. Cheguei ao ponto de achar que tinha
um tumor no cérebro por causa das náuseas e tonturas constantes. Mas não, era “só”
a Diana que os médicos não conseguiam detectar!
Tive muitos problemas durante a gravidez e isso forçou-me a
ter que parar de trabalhar aos 5 ou 6 meses de gestação.
Foi aí que percebi da pior maneira que o termo “recibos
verdes” significa que direitos é uma palavra que automaticamente deixa de fazer
parte da tua vida.
Juro que sentia que estava a viver um pesadelo. Tentei falar
com chefias que podiam fazer alguma coisa (como empregarem-me para que eu pudesse
receber ordenado durante a baixa e quando a Diana nascesse), mas em vão.
Pessoas que se sentaram a 5 metros de mim, na mesma sala durante 2 ou 3 anos,
com quem convivi fora do trabalho e que quando chegou a altura de provar o tipo
de ser humano que eram, simplesmente ignoraram-me.
Lembro-me como se fosse hoje. Abordei uma colega que
hierarquicamente era superior a mim e pedi-lhe ajuda. Ela já era Mãe com três
filhos, achei que como Mãe ela seria compreensiva. Expliquei o que se passava e
que não queria perder o emprego (algo que ela já estava a par). O desconforto
na cara dela era notório. Não porque ela não pudesse fazer nada mas
simplesmente não quis ajudar porque não era a responsabilidade dela.
Perdi mesmo o meu emprego e fiquei de baixa médica sem
direito a nada, sem ser o apoio à natalidade implementado pelo José Sócrates
que na altura era cerca de €146 por mês. Esse incentivo foi entretanto abolido
porque como toda a gente sabe, Portugal tem abundância de crianças! Passei mal
nessa altura. Bem mal! E a minha fé nas pessoas ficou bastante abalada.
Claro que investiguei tudo sobre recibos verdes, algo tinha
que estar errado e descobri que eu era um caso de falsos recibos verdes por
variadíssimas razões. Tentei avançar com processo em tribunal mas também isso
em vão. Fiz queixa na Direcção Geral do Trabalho mas nada aconteceu. Ninguém
queria saber. E eu estupefacta.
Depois de uma gravidez complicada e que inclusivamente me
obrigou a estar internada, a Diana nasceu via cesariana em Dezembro. Tinha ela
3 meses de idade quando a minha Mãe me disse que precisava de ajuda na escola
dela e que considerando que eu tinha contas para pagar, se eu queria ir
trabalhar com ela. Aceitei. Levava a menina comigo todos os dias de manhã para
Lisboa e lá passávamos o dia as três juntas.
Meses muito complicados mas de alguma forma, com a ajuda da
minha família, lá superei, lá me levantei, lá voltei para a Universidade e lá
me formei.
Isto tudo para dizer que a Diana vai agora fazer 8 anos. E
em 8 anos, Portugal continua podre. Corrupção em todo o lado e é o País onde
políticos roubam sempre daquele que menos pode suportar perder nem que seja €1.
Eu agora vivo num País onde isto seria impensável acontecer
e caso acontecesse, o empregador estaria em muitos maus lençóis. E eu receberia
uma grande compensação financeira.
Fico parva com as notícias que me chegam. A UGT a fingir que
se importa com os trabalhadores e a pedir um aumento de salário mínimo para os
€565 mensais e o Governo a dizer que os empregadores não conseguem suportar
esse valor.
É como se estivesse a assistir a uma peça de teatro de fraca
produção com péssimos actores a quem me apetece atirar ovos para cima e exigir o
meu dinheiro de volta. O problema é que esses ovos são provavelmente o almoço e
o jantar de muita gente e a cortina fecha-se comigo incrédula de como é que
isto continua a acontecer num País que supostamente pertence à UE e em 2016.
E depois
espantam-se de eu ser a favor do Brexit. Encher mais o cú a essa gente mesmo
estando aqui? Não obrigada. Sim, porque o dinheiro que Inglaterra paga à UE é
fruto dos impostos que aqui pago. Estive perto de passar fome pela ausência de
protecção para mim e para a minha filha por parte do Governo. Já tive a minha dose.
Finalizo com uma questão que continua a pairar na minha
mente: como é que há pessoas que deitam a cabeça na almofada ao final do dia e
conseguem dormir sabendo o mal que fazem a milhares de pessoas diariamente? Não
consigo compreender.