Quando és inicialmente confrontado com a ideia de emigrar, das duas uma: ou sabes que é temporário e que eventualmente voltas para o teu País ou então vais com a ideia de “vamos ver no que dá”, sabendo perfeitamente que a possibilidade de te instalares permanentemente no estrangeiro é real.
A forma como estas duas possibilidades são abordadas tem um grande peso na forma como te relacionas com os teus amigos. Não digo família, porque tradicionalmente nós Portugueses somos bastante chegados à família e isto não acontece.
No meu caso, emigrei com a segunda ideia mencionada acima. Vim para Inglaterra sabendo perfeitamente que a ideia de regressar a Portugal era bastante diminuta. No inicio foi complicado, admito. As saudades de casa e da comida custavam mas acima de tudo fazia-me falta o conforto psicológico que é saber que estava na minha zona de conforto.
Perdi tudo isso a partir do momento em que o avião descolou. Deixei de pertencer a Portugal mas na verdade também não pertencia a Inglaterra. Fiquei quase como órfã e não consigo evitar sentir-me assim mesmo que pouca gente o compreenda.
A realidade inicial era que os meus amigos metiam posts no meu Facebook, comentavam as minhas fotos a dizer que tinham saudades e para eu voltar; quando eu ia a Lisboa faziam questão de me ver e as conversas mantinham-se inalteradas.
Depois, sem eu perceber muito bem como, tudo isso mudou. Os comentários nas fotos passaram a ser apenas um Like ocasional, as mensagens passaram a ser recebidas com semanas de intervalo.
Quando emigras apercebes-te que começas a perder aniversários, baby showers e nascimentos mas vês tudo isso acontecer através do écran de um computador. Perdes casamentos porque um convite nunca chegou. Porque naquele momento, a tua amizade já não é importante nem forte o suficiente para festejar um evento que (supostamente) acontece uma vez na vida. É-te dito que foi preciso fazer escolhas e tu manténs a postura mas por dentro ficas na merda porque sabes que se fosse ao contrário, nao haveria sequer escolha possivel sobre a presença de A ou B.
Não passas duma memória distante prestes a desaparecer da mente daqueles em quem tu ainda pensas quase diariamente. Porque afinal, foste tu que te foste embora.
Tu continuas num País que nao é o teu. O teu coração mantém-se em Lisboa e em Lisboa, a vida continua sem ti.
Os teus amigos continuam a fazer jantaradas e almoçaradas, continuam com o dia a dia e com planos para o fim de semana, vida essa da qual tu já nao fazes parte. Continuas a testemunhar as amizades que se mantêm e começas a observar que há pessoas novas nessas fotos que tu não sabes quem é nem nunca ouviste falar.
Quando finalmente, sim FINALMENTE estás de férias e sentes que finalmente vais poder respirar de novo porque estás em casa, fazes de tudo para estar com os teus amigos e mostrar que a amizade se mantem. Tens coisas que queres partilhar e queres saber as novidades. Entristece-te quando eles pouco ou nada tentam porque o diariamente continua e é complicado planear coisas com 3 ou 4 meses de antecedência.
Mas tu precisas desses 3 ou 4 meses meses para conseguires um voo com um preço mais acessível e porque precisas marcar ferias no trabalho. Gostavas de um pouco mais de compreensão mas ao final do dia foste tu que te foste embora.
Vai chegar o dia em que as mensagens que já tão raramente acontecem, vão cessar.
Vai chegar o dia em que vais estar de férias mas tu própria já não vais enviar mensagens de grupo a avisar que estás por perto e que adoravas ver aquelas pessoas que fazem o teu coração ficar quentinho. Porque mais uma rejeição daqueles com quem cresceste vai doer e já custa a dor que sentes diariamente num País que não é teu.
Vai chegar o dia em que tu há muito que és uma memória distante e que vais ter que aceitar a nova realidade em que te encontras.
Vai chegar o dia em que vais ter que aceitar que és de nacionalidade e criação Portuguesa mas que a cada dia que passa começas a ser menos e menos uma emigrante e cada vez te misturas mais com a cultura Britânica. O sotaque já não soa Americano porque aprendeste Inglês a ver filmes; pedes desculpa e obrigada 40 vezes por dia. Sabes que definitivamente algo mudou em ti quando ficas solenemente irritada com a falta de cortesia de algumas pessoas em situações mundanas como a ausência de um acenar de mão quando cedes passagem.
Vai chegar o dia em que aqueles com quem cresceste vão ser uma memória distante porque para atenuar a dor e não largares tudo aquilo que tanto lutaste num País que não é teu, não tens escolha.
E para deixares de te sentir órfão, tens que fazer uma escolha. E a escolha apesar de difícil, e aquela que te vai manter no rumo que escolheste para ti, para a tua vida e para os teus. Se estás no mesmo barco que eu, força! Porque para a frente é que é caminho.
Olá Estrelinha!
ReplyDeletePercebo tudo o que escreveste porque já passei pelo mesmo várias vezes! Ajuda se vires as coisas de outra perspetiva:
Tu também tens jantares de grupo no qual os que ficaram não participam, tu também criaste rotinas e ganhaste novos amigos que ocupam o lugar dos anteriores. Os outros estarão sempre lá, mesmo que não os consigas visitar quando voltas, mesmo que a amizade mude, um dia, se voltares eles também arranjarão um lugar novamente para ti na vida deles. Acredita que eu sei.
Não desistas deles e mantém o contato. A rotina e a azáfama do dia-a-dia ocupam rápidamente o espaço dos que estão ausentes.
Mas não deixes de fazer o que dizes: segue em frente. Vais criar novas amizades e tal como toda a gente vai chegar um dia em que vais passar a ter dois países e se voltares para cá são os daí que te vão fazer falta!
Carpe Diem!
Beijinhos, Cláudia Valadinhas
Adorei! Adorei a letter e adorei o comentário! querida Sofia, ninguém te esquece, apenas o tempo corre a ritmo diferente... E não chores, tristezas não pagam dívidas, ri-te sempre, o mais que puderes, porque tu és uma lutadora e estás a encontrar a tua felicidade! Que bem mereces! E tens sempre e ainda muitos amigos que te adoram e nunca te esquecem!
ReplyDeleteShiló, muito bem dito!
abração às duas!
:-)
Compreendí muito bem, pois é a história de parte da minha vida.
ReplyDeleteSó com a diferença que eu fui primeiro para a Suécia, e depois para a Noruega. .. Há 50 anos atrás.
Eu saí em 1985 para Bruxelas e regressei doze anos depois, em 1996, ainda que não exactamente para Portugal, mas para mais perto, Sevilha, que por ser tão perto (150 kms da fronteira e 200 kms de casa) foi considerado por mim um regresso definitivo. De 85 a 96 não havia ainda skype nem redes sociais nem viagens baratas de avião, o telefone fixo era caro. Posso afirmar que a vida foi muito dura. Mais duro ainda foi constatar que as amizades mudaram e até a familia mudou de relacionamento. Mas também constato que quem sabe ter amizades (pouca gente) continua a amizade, com emoção e alegria. Também compreendo e respeito muito quem está desenraizado, porque sei o que é isso.
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